"Em 1964, comecei a fazer o show Internacional Set, no início da minha carreira, e meu chefe me mandou colocar uma peruca loira para o palco. Na remontagem do espetáculo, pouco tempo depois, ele me mandou pintar o cabelo pois eu tinha nascido para ser loira.
Cheguei em Paris no fim de 1974, e eu tinha muita purpurina francesa, que haviam efeito de mini diamantes, e colocava no cabelo. Imagina o efeito incrível que dava, quando eu soltava aqueles fios e jogava a cabeleira para jogo? Linda!
Depois, fui para os Estados Unidos, foi o Haroldo Costa que me levou para a América. Tinha um dono de cassino que queria brasileiras bonitas no elenco dele e alguém falou de mim. Porém, quando falaram pra ele que eu era travesti, ele não quis me contratar. Não desisti e fui lá me apresentar para ele. Quando terminei o show, já estava contratada e ele estava muito entusiasmado comigo. Isso foi 1975.
O Haroldo Costa me reprimia e dizia que eu não precisava falar pra todo mundo que eu era homem por baixo daquelas roupas. Mas, o meu prazer era falar a seguinte frase: Senhoras e Senhores, eu não sou uma garota e sim um garoto! E eu só falava isso depois que envolvia o público, principalmente os americanos. Gostava de ver a reação das mulheres com os homens, que estavam todos assanhados por mim. Foi uma coisa fantástica esse período da minha vida.
Meu sonho era ser estrela do espetáculo do Carlos Machado, que só trabalhava com mulheres. E eu fui a primeira a conquistar essa vaga. Pode parecer pequeno, mas essa vitória foi muito importante pra mim.
A África foi minha primeira parada internacional, em Luanda, com sete shows. Você acredita que eu não aconteci no primeiro show? Naquela época e para a cultura local, quem era travesti só fazia striptease e prostituição. No meu segundo show, um português veio ao meu camarim e acabou me levando para Portugal. Lá, eu saí na capa de uma revista famosa, fiquei me achando! (risos)
Na Espanha, me ofereceram operação de mudança de sexo e eu agradeci. A polícia de lá não deixava eu entrar totalmente de mulher no palco, era lei se não me engano. Então, só poderia fazer meus shows, se eu fosse uma mulher total. Mas, não queria me operar de jeito nenhum.
Foi em Paris que resolvi me vestir de mulher de dia também. Lá, as mulheres zombaram de mim e eu aprovei para esfregar na cara delas a minha beleza, pois resolvi colocar a produção toda de dia, só para provocar. Pouco tempo depois, na Praça Tahrir, no Cairo, Egito, eu quase levei uma surra das pessoas. Um taxista parou e me resgatou, quando eu olhei pra trás, tinha mais de 100 homens correndo na minha direção. Eu já estava viajando há muito tempo pelo mundo e, claro, o Brasil começou a me chamar de volta! (risos) Só que meu chefe no Cairo não queria me deixar voltar. Fingi um ataque epilético na frente dele, tipo babando mesmo, e ele me deixou viajar… Simples, não?
Até hoje me lembro quando a ideia de parar de usar peruca passou pela minha cabeça. Um dia fui ao cabeleireiro e ele me disse que tinha muito cabelo bom. Ele falou que eu pareceria uma mulher rica com aquela cabeleira toda e não é que ele tinha razão?
Não faço hidratação para cuidar do cabelo.. A única vaidade que tenho é que não pode aparecer um dedo de raiz. Se ela aparecer três dias depois da aplicação da tintura, eu refaço sem o menor problema. O segredo do cabelo saudável é ir pintando somente a raiz e nunca o os fios todos. E a tinta é a mesma, L’oreal número 10, que uso há 40 anos. Faço meu assistente ir até o inferno para achar.
Não me arrependo de nada e faria tudo de novo. Fui verdadeira na minha vida e continuo assim. Causei e quero continuar causando nesse mundo, que anda tão chato."