Novela da Globo foi taxada como subversiva e autora tentou impedir censura com carta escrita à mão para representante do Governo Militar
Bárbara Aguiar, sob a supervisão de Arthur Pazin Publicado em 13/12/2024, às 07h30
Em 13 de dezembro de 1976, há 48 anos, a TV Globo estreava Duas Vidas, trama da consagrada Janete Clair, autora que precisou escrever uma carta encaminhada ao Governo após sofrer com a censura em mais uma de suas narrativas. A trama de Duas Vidas abordava temas como um relacionamento entre uma mulher mais velha com um jovem rapaz e críticas à obra pública de um metrô, o que incomodou o Regime Militar.
O principal ponto da Censura contra a obra de Janete Clair, de acordo com o jornalista Nilson Xavier, do site Teledramaturgia, foi a crítica à obra pública do metrô, considerada na época o símbolo do progresso nacional. Pela abordagem escolhida na narrativa, os censores classificaram a novela como "subversiva" e contrária aos "bons costumes", o que rendeu ao Governo a liberdade para cortar cenas e diálogos.
Indignada, a autora enviou uma carta ao diretor da Divisão de Censura e Diversões Públicas, Rogério Nunes, argumentando contra os cortes. "Não posso entender igualmente o porquê da proibição de outra cena em que o dono de uma casa de móveis reclama contra a poeira produzida pelas obras do metrô, que lhe emporcalha os móveis e afugenta a freguesia, quando todos nós sabemos dos transtornos ocasionados por essa obra pública", questionou Janete. O apelo, entretanto, foi em vão: a censura manteve os cortes e a novela não conseguiu se desenvolver plenamente.
Duas Vidas, como destaca a análise de Xavier, foi uma continuação da fase realista que Janete havia iniciado com Pecado Capital. O enredo explorava o impacto das obras do metrô no bairro do Catete, Rio de Janeiro, e mostrava como as desapropriações afetaram a vida de moradores. Dividida em três atos, a história começava com o Carnaval de 1974, abordava a dispersão dos personagens pelo Rio e culminava no reencontro de suas vidas transformadas.
O realismo era destacado pelas locações reais e a temporalidade próxima à vivência do público. Contudo, a abordagem ousada gerou resistência tanto da censura quanto do público conservador, que preferia tramas focadas no melodrama tradicional.
Muitos telespectadores, inclusive, enviavam cartas a Janete pedindo por um final feliz para o casal central, Leda Maria (Betty Faria) e Vitor (Francisco Cuoco), contrariando o destino inicialmente planejado por Janete.
Em entrevista da autora à revista Cláudia em 1977, resgatada pelo Teledramaturgia, ela revelou sua visão sobre o público: "Hoje em dia, estou muito mudada, não procuro mais só temas românticos, já escrevo procurando contestar alguma coisa. Mas o público gosta só de sofrer! (...)", mesmo com a fala, o final agradou aos fãs da novela, já que o casal protagonista conquistou a felicidade.
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