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"A vida é uma luta" Maria Clara Spinelli

No ar em Supermax, a atriz fala de sua volta à TV, transexualidade, preconceito e realização do sonho de viver da almejada profissão

Ligia Andrade Publicado em 04/12/2016, às 11h29 - Atualizado em 07/08/2019, às 17h45

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Maria Clara Spinelli - Renato Rocha Miranda
Maria Clara Spinelli - Renato Rocha Miranda
"Uma mulher que nasceu transexual.” Assim, Maria Clara Spinelli, 41 anos, descortina a sua história. A atriz paulista, intérprete de Janette, uma das participantes da série Supermax (Globo), confessa que falar sobre sua transexualidade era um tabu. Hoje, não mais. “As pessoas não sabem o que significa ser alguém que nasceu transexual. Não me defino como transexual, transmulher, transex, muito menos como atriz transexual. Eu me sinto, represento e sou uma mulher. E é isso que quero que as pessoas percebam”, esclarece Maria Clara. E continua: “Muita gente acha que eu sou homem, gay, travesti, crossdressing, pervertida, louca, muitas coisas... Nada contra, mas não sou nada disso. É difícil ter de provar o tempo todo quem é, o que você é, e não ser aceita, não ser vista, não ser amada e não representar sua essência, como se sente.” O percurso não foi fácil. Ela não esconde que passou por vários problemas físicos, emocionais, psicológicos, fez uma série de tratamentos, “com apoio para corrigir todos esses problemas, físico e legalmente”. Olhando o que passou, tem orgulho dessa transformação. “O que eu sou hoje é resultado do que eu fui ontem, e a minha trajetória é muito bonita.” 

Janette passou por maus bocados em Supermax, incluindo agressão física. Maria Clara nunca sofreu nenhum tipo de violência transfóbica desse nível. O mesmo não se pode falar da de cunho moral... “Passei, passo e acho que vou passar. Mas acho que isso não é um privilégio meu. A vida é uma luta. Não podemos desistir nunca”, opina. Para a atriz, a série é mais uma ferramenta a fim de combater esse tipo de preconceito. “Os roteiristas criaram essa personagem que representa uma minoria, vítima de estigmas e tabus, e isso ser contado com tanta dignidade do começo ao fim é um ganho”, avalia ela, sem receio de ficar marcada por papéis transexuais. “Já tive. Claro que gostaria de fazer outros personagens também, mas entendo que, se me derem mais papéis transgêneros, não é pessoal.” 


Vaidosa e caseira
Foi ainda criança, assistindo aos clássicos ... E o Vento Levou e Com Licença, Eu Vou à Luta, que Maria Clara começou a se interessar pela arte de atuar. Na adolescência, fez parte de um grupo de dança e de teatro. “Comecei a desenvolver pequenas peças até chegar a meu primeiro monólogo, pelo qual ganhei o Prêmio de Atriz Revelação no Mapa Cultural Paulista”, recorda ela, protagonista do longa Quanto Dura o Amor? (2009). O trabalho a projetou internacionalmente, porém chegar à TV não foi fácil. “Fui premiada como Melhor Atriz, em Mônaco e Los Angeles (Estados Unidos). Achei que minha carreira deslancharia a partir dali e foi difícil encarar outra realidade. Só queria trabalhar e cheguei a pensar que não realizaria meu sonho de ser atriz.”
Depois de trabalhar dez anos como funcionária pública em Assis, interior de São Paulo, Maria Clara vive da almejada carreira. Estreou nas novelas em Salve Jorge (Globo, 2012), e, recentemente, foi procurada pela autora Gloria Perez, que escreverá a próxima novela das 9. “Não fui escalada. Ela me mandou mensagem porque vai falar de transexualidade. Gloria faz um trabalho social importante. Não basta ser transexual, tem que ter talento. Trabalhar com ela, se acontecer, agora ou depois, vai ser uma honra muito grande”, torce.

Supervaidosa, Maria Clara não toma sol, cuida da pele, do cabelo e da alimentação. “Faço menos exercícios do que gostaria. Tento me cuidar, acho importante. Não gosto de fazer musculação, prefiro artes marciais. Não como carne vermelha. Quero voltar a ser ovolactovegetariana, depois só vegetariana e, no futuro, vegana. Não é fácil...” E declara ainda levar uma rotina pacata em Assis. “Não sei se sou a pessoa mais famosa da cidade, mas transformo isso em uma coisa natural. Sou acessível e igual a todo mundo.”