Trama da Tupi sofreu com crítica de diversos grupos, passou por censura e lidou com greve de atores da emissora, que não recebiam pagamento pela novela
Publicado em 13/11/2024, às 07h30
Em 13 de novembro de 1978, há 46 anos, a TV Tupi, pioneira no ramo televisivo no país, estreava Aritana, novela de Ivani Ribeiro sobre Aritana (Carlos Alberto Riccelli), um rapaz que vivia no Xingu, filho de um branco e uma indígena. Mesmo com os cuidados da autora, que contou com a assessoria de indigenistas para escrever os capítulos, a trama causou polêmica em meio a crise enfrentada pela emissora na época.
Para escrever a novela, Ivani foi assessorada pelos irmãos indigenistas Cláudio, Orlando e Álvaro Villas Boas e teve ajuda do professor Olympio Serra, então administrador do Parque Indígena do Xingu, no Mato Grosso. Os cuidados da autora, entretanto, não foram suficientes para expressar suas intenções com a trama.
Inicialmente, como afirma o jornalista Nilson Xavier, do site Teledramaturgia, o enredo foi muito criticado por adentrar no seio da vivência indígena e televisionar os costumes, já que uma parte da novela foi gravada no Posto Leonardo Villas Boas, no Parque Indígena do Xingu, e teve participação de algumas comunidades da região, como os Yawalapitis e os Kamaiurás.
Xavier resgata uma crítica da colunista Cinira Arruda, da edição de fevereiro de 1979 da revista Amiga: "Se a proposta é alertar e defender o índio, por que essa rede de televisão invade o Parque do Xingu, com equipes técnicas, atores, máquinas e máquinas conturbando o sossego dessa gente tão tumultuada? (…) Aplaudo a linha sutil na qual, inteligentemente, Ivani mostra que nós civilizados somos muitas vezes mais selvagens. Entretanto, abomino vê-los transformados em extras de TV. A Tupi mostra claramente, com o apoio da Funai, que os índios, mais uma vez, estão sendo desrespeitados. E agora via Embratel", escreveu.
Além das falas contra a exposição indígena, a novela também sofreu com críticas de quem queria que o tema permanecesse esquecido, já que o personagem Aritana lutava pela demarcação de uma região para seu povo. A censura da ditadura, inclusive, tentou impedir a estreia da novela. Um mês antes do lançamento, um censor analisou que a trama tinha "um caráter nitidamente ingênuo de quem pretende focar um tema sem conhecê-lo devidamente: o caminho está aberto, portanto, à desinformação e à deturpação", mas mesmo com a observação, Aritana foi ao ar.
O folhetim de Ivani enfrentou, ainda, a pior fase da crise da TV Tupi, que caminhava para o seu fim. Xavier relembra que, pouco mais de um ano após o fim da novela, a emissora fechou. Na época, os atores estavam há meses com atraso no recebimento dos salários e iniciaram uma greve que prejudicou consideravelmente Aritana.
No livro De Noite Tem… Um Show de Teledramaturgia na TV Pioneira, o diretor Luiz Gallon lembrou: “Chegou ao ponto de eles não gravarem para não deixar fechar o capítulo. Aí eu combinei com o [Carlos] Zara [então diretor artístico da emissora]: não pode deixar de ir capítulo para o ar. Não importa se o capítulo vai ter 45 minutos ou só 15. Então, em vez de eu gravar um capítulo inteiro, gravo quatro partes, não fecho capítulo. A gente na segunda-feira passa uma parte, e na terça passa outra, sem nada, sem intervalo”. E foi assim que a novela seguiu até seu final, em 30 de abril de 1979, se tornando uma das últimas da Tupi.
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